. raio negro .
by Os dias do meio
trovões são bons sons que me confortam.
sou abraçado quando o céu estremece. protegido, até.
o som de penedos rasgados, montanhas derrocadas
a destruição invisível do que não tem forma
um colo no silêncio que antecipa o estrondo.
fico entregue à luz e ao som, encontro refúgio na meteorologia feroz.
sempre que posso, observo a tempestade.
⚡︎
a minha irmã tem medo, já teve ou já não sei.
por isso penso nela quando troveja. ligo-lhe.
da última vez ela descartou o desconforto
que as trovoadas sempre lhe trouxeram.
talvez eu já não tenha a certeza,
mas gosto de pensar nela quando oiço trovões.
assim é que está certo.
⚡︎
oiço a trovoada e lembro-me que sou apenas eu,
despido no capim comprido
descalço e inteiro, molhado pela chuva.
perante o trovão sou um minúsculo enorme
imortal perecível, um gigante impossível.
uma vez senti o calor de um relâmpago no rosto
foi o mais próximo que estive de um raio sem me apaixonar.
© margarida